25.3.08

SEXO SONORO


Tina Turner – Acid Queen (1975)

Imagine se uma das levadas mais características do Led Zeppelin, em que os agudos de Robert Plant se destacam, fossem trocados por gritos e gemidos de uma voz negra feminina. Também pense que com toda a pauleira do The Who, seus integrantes mudassem os malabarismos com o microfone de Roger Daltrey por uma negra sedutora que encarasse seu microfone como se fosse um falo pronto para ser degustado, e, ao mesmo tempo, troque as danças aeróbicas do vocalista dos Rolling Stones, Mick Jagger, por um belo par de pernas de uma negra sensual, vestida em uma pequena saia brilhante, fazendo uma dança frenética e orgástica? Imaginou?!?!

Todos os grandes vocalistas do rock citados nunca aprontaram suas orgias musicais sozinhos, tendo ao seu lado performáticos guitarristas que não deixavam o clima esfriar. Essa ‘Musa Black’ também não seria diferente! E, ainda envaidecida de prazer, traria consigo um marido ciumento, guitarrista subestimado e hoje esquecido, para mandar ver em uma segunda viagem solo, expelindo todo seu estupor sexual, como um voyeur ensandecido pelo balanço de sua mulher.

Agora junte as características descritas para essa garota e acrescente o sabor Funk & Soul desenvolvido pelo maridão, e você terá todo o desempenho de Tina Turner em Acid Queen. Lançado em 1975, o álbum é um apetitoso exemplo do encontro de Tina Turner com cadenciadas versões de músicas das bandas citadas no primeiro parágrafo. Das nove faixas, cinco são covers – ‘Whole Lotta Love’, ‘Let’s Spend The Night Together’, ‘Under My Tumb’, ‘I Can See For Miles’ e ‘Acid Queen’, essa última impulsionaria a carreira da cantora para a interpretação, colocando-a como a Rainha do Ácido, no filme Tommy, da banda The Who – e as outras quatro são composições do parceiro Ike Turner. Especialista em fazer versões dançantes de clássicos roqueiros para a Turner fêmea interpretá-los com toda a libido – Prody Mary é o caso mais famoso – o Turner macho arrasa por todas as faixas, com guitarras cheias de swing. Sua participação no álbum talvez tenha, à época, amenizado seu complexo de inferioridade perante o sucesso de sua mulher, fazendo com que não o abalasse mais uma vez, resultando em pancadaria para cima de sua amada. O contato direto com os Rolling Stones é bem perceptível nas composições do Turner macho: ‘Bootsy Whitelaw’ e ‘Pick Me Tonight’, onde ele produz uma boa mistura rítmica do seu Soul-Funk, com as levadas de guitarra tipicamente stoneanas. Já Tina é puro prazer: ela suga toda energia das batidas, goza de seu poder vocal e imprime todo seu apetite sexual em interpretações excitantes, satisfazendo o ouvinte e deixando um gostinho de quero mais.

Advertência: cuidado para não viciar.

9.3.08

A NOVA PINTURA DOS CORVOS


Black Crowes – Warpaint (2008)

Após sete anos sem lançar material inédito, a Black Crowes pinta a cara e faz a (r)evolução musical do seu rock retrô. Assim como os Rolling Stones fizeram em 1970, ao criar o seu próprio selo para lançar a melhor safra de sua duradoura carreira, ou o Led Zeppelin, que também fez o mesmo, criando o selo Swan Song e colocando o álbum duplo Physical Graffiti na praça em 1975, os Crowes criaram o selo Silver Arrow, depois de 18 anos de estrada e apenas 6 álbuns de estúdio. Warpaint é um complexo de dez inéditas e mais uma interpretação pesada do blues God’s Got It, clássico do Reverendo Charlie Jackson, que remete ao mesmo poder de Back of My Hand, o blues raiz que os Stones compuseram para seu último álbum, A Bigger Bang, de 2005.

Warpaint traz também novos corvos para a batalha: além da produção de Paul Stacey, que havia substituído o guitarrista Marc Ford na turnê All Join Hands, mas que não se alistou no front de batalha para a nova turnê, temos o guitarrista Luther Dickinson, oriundo do North Mississippi Allstars, mais o tecladista Adam MacDougall.

Cheio de blues, folk e psicodelia, o álbum gravado em três semanas em Nova Iorque, tem personalidade forte, consistente e se distingue bem dos trabalhos anteriores, embora algumas canções possam se aproximar das viagens e do clima de 3 Snakes and 1 Charm, lançado 1996. São perceptíveis também as características que fizeram da banda uma referência concreta para o rock and roll feito nos anos 60 e 70, além da originalidade e, ao mesmo tempo, reverência que possam colocá-los ao lado dos grandes artistas do rock clássico. O álbum foi gravado ao vivo em julho do ano passado, com o mínimo de takes possíveis, não traz nenhuma canção que fora composta anteriormente, e evidencia a progressão musical natural da discografia da banda de Atlanta, principalmente, para quem a acompanha desde seu início, isso fica mais perceptível. O álbum não é necessariamente conceitual, mas as letras remetem aos valores da revolução contracultural que foi deixada para trás por aqueles que a protagonizaram, e seus filhos que não a seguiram.

Goodbye Daughters of Revolution é a flechada inicial, lançada em single no final de Janeiro e abrindo perfeitamente Warpaint. Embora eles estejam dando adeus os filhos da revolução, dão boas vindas aos órfãos da geração hippie com um som tipicamente Black Crowes, ou seja, tipicamente rock and roll clássico, e mantendo a chama viva.

Walk Believer Walk é outra com um peso preciso, calcada no blues, e como definiu Chris Robinson “cheia de veneno para incrédulos”.

Oh Josephine é soul, gospel, country e psicodelia misturados, batidos e temperados de maneira original para uma balada que Chris considera a melhor canção que ele Rich compuseram.

Evergreen tem o mesmo sabor das músicas do álbum solo de Rich Robison, Paper (2004), um solo excêntrico e arrepiante de Luther Dickinson, e foi gravada em só take.

Wee Who See The Deep, é pesada, funk e louca!!! A guitarra slide duela com os maneirismos vocais de Robinson. Jimmy Page e Robert Plant fizeram escola.

Locust Street traz os raios solares da Califórnia para o álbum, balada de beleza singela, com violões e mandolin contrapondo ao clima pesado da letra, em que Chris Robinson tem uma visão Bob Dylan de seu país.

Movin’ Down The Line foi a primeira a ser gravada nas sessões do álbum. Traz várias mudanças rítmicas e climáticas, ‘mas está tudo certo, irmãs e irmãos’. Chris está arrebentando na gaita e um primor nos vocais.

Wounded Bird é uma das melhores faixas do álbum, rock direto, refrão viajante, contagiante e básico. Apenas libere sua mente e viaje.

There’s Gold In Them Hills é outra balada em que Chris Robinson avalia a vida de artista, sua beleza artística e sua prostituição mercadológica ao efeito do tempo de sua própria carreira. O trabalho do novo tecladista ganha destaque nessa faixa.

Whoa Mule é a música mais otimista do álbum e foi escolhida para fechar o ritual de guerra do Black Crowes em Warpaint. Ritmos apaches, misturados com o folk europeu, canto indígena americano encontrando as raízes indianas e celtas das terras mais antigas do mundo.